Flagrante cena teatral, tomada de desfaçatez e cinismo, armada na sessão do último dia 15 de dezembro de 2022 na Câmara Municipal de Ipiaú, que aprovou o projeto de lei PL 017/22 do orçamento 2023 “da prefeitura municipal” , avalia o arquiteto e urbanista, em texto com dados e ilustrações
Elson Andrade
Exclusivo para a 2D
Um velho professor universitário costumava começar suas aulas dizendo: “As pessoas podem até estar vivendo no mesmo espaço, porém, cada uma a seu tempo”! E completava – Existe defasagem de tempo-consciência de uma pessoa para outra, de mais de 50, 100 anos, mesmo estas sendo vizinhas!
Nas suas aulas de Semiótica (ciência dos signos e dos seus significados nos processos da percepção cognitiva, cultural e da natureza humana) o experiente e astuto professor sempre destacava que a percepção humana tem ao menos, 3 níveis, beeem distintos:
Primeiridade, Secundidade e Terceiridade.
E que infelizmente, nem todas as pessoas são capazes de perceber coisas óbvias explicitas, que ocorrem ao seu lado, que dirá, nos submundos, latentes, em especial, nas disputas de poder, dos orçamentos públicos, das finanças e da contabilidade bancária, das artes, dos dogmas religiosos, das relações sexuais…
Com outras palavras, não acadêmicas, poder-se-ia resumir os tipos de sujeitos e suas respectivas percepções:
Primeiridade: Aqueles que até veem, mas não enxergam e/ou acreditam propriamente no que veem. A massa de manobra, devotos dependentes, preponderantes em quantidade e baixa qualidade perceptiva, organizados em bandos e alocados propositadamente, como se fossem mesmo rivais. Os “Inocentáveis”;
Secundidade: Aqueles que veem e até enxergam, o, e no raso. Os instrumentos-meio quase involuntários. Rasos Soldados-Pracinhas. Os Culpáveis;
Terceiridade: Aqueles que veem, enxergam e articulam previamente tudo, com dolo, articulado-intertravado, estruturado e previamente calculado. Os ardilosos e certeiros Gaviões Carcarás impiedosos dos sertões;
Distinção qual, veladamente posta, porém, muito clara aos olhos dum exótico e bom observador, num jogo de cena por detrás das disputas e formas escusas na apropriação dos Valores, Bens e Recursos Públicos, [destinados-alocados por rubricas] para grupos organizados que falam a mesma língua, jogam no mesmo time, se comunicam via piscadela de olho e comungam da mesma sanha-objetivo.
Assim tem sido país afora, tal qual a flagrante cena teatral, tomada de desfaçatez e cinismo, armada na sessão do último dia 15 de dezembro de 2022 na Câmara Municipal de Ipiaú-BA, que aprovou o projeto de lei PL 017/22 do orçamento 2023 “da prefeitura municipal”.
Dos 13 edis eleitos pelo povo da Primeiridade, haviam no pleno, tão somente 12 vereadores. Um, supostamente (desconfiado da Secundidade), logo se acovardou da missão, e, preferiu previamente “justificar” a sua ausência, para que historicamente, seu nome não figurasse como parte na referida peça teatral subordinada, dos grupos beneficiários, operadores do velado sistema, de raiz organizacional soteropolitana.
Dos 12, 7 da base aliada e 3, da base alienada, além de 2 aparentemente do: Oscilante grupo pecuniário de “protestantes” de plantão. Do todo, apenas 3 ou 4, de fato tinham percepção nuclear da Terceiridade, e, portanto, dotados de domínio temporal, conscientes do litúrgico jogo em procissão, e, da real importância do momento exato da oficiosa abocanhada-partilha dentro dum sistema “público”, em disputas patrimoniais na velada peça orçamentária anual, daquela pequena prefeitura-vítima.
O caso em tela,(PLOA-23) todo o imbróglio, começou ao se “esconder” a sete chaves, [até o último minuto de ser colocado em votação] inclusive, depois de ser aceito pelo pleno, a votarem o PL em sessão única, com o vil argumento superficial de votar logo para poder se encerrar o ano legislativo, e todos saírem de férias…
O projeto foi então rapidamente aprovado, sendo que muitos vereadores e cidadãos, sequer tiveram [ciência numérica] do seu conteúdo, origem e destino alocativo orçamentário em jogo.
Esquema-modelo que historicamente, tem funcionado em quase todas as casas legislativas de todo o país. Manchete comum, até nos condomínios, sindicatos e associações. Tendo como Cena Ápice, quando o presidente questiona: “Quem for contra que se alevaaaante, e quem for a favor, que permaneçam como estão-aprovado”.
Na perspectiva do povão da Primeiridade, para estes, o poder público figura, tal qual as carretas que costumeiramente capotam, recheadas de mercadorias, na tradicional curva da BR 101, na entrada da cidade de Wenceslau Guimarães-BA. Quando e onde muitos correm pra cima da desgraceira alheia para saquear. Já virou uma tradição, oportuna ocorrência “natural”, motivo carente recheado de jocosidade.
Chefe oficial, do executivo local(sem formação capaz, aparentemente da turma da Secundidade) tem olhos alheios onipresentes e braços “invisíveis-voluntários”, hábeis, sagazes e providentes-“legalistas”. Na condição de carimbo oficial, e não de cérebro e líder real, cumprem a sina-destino, quase maternal, de permitir que a(as) cria(as) chegue(m) ao podium da riqueza, ultrapassando inclusive, a riqueza-herança do progenitor fujão. (projeto maior).
Dizem que um raio não cai 2 vezes no mesmo lugar, pois em Ipiaú, além do raio ter caído 2 vezes na subestação de energia da cidade, o governo federal, em 2022, ao transferir repasses dos Royalties do Petróleo ANP, transferiu evidentemente errado, dois valores (março e abril) 10 vezes maiores, que os devidos. Suposto erro da ordem total de R$ 22 milhões, a mais. Valor superior a toda a receita bruta da cacauicultura local, em 2022.
Com a justificativa de – achado não é roubado… o barco vem seguindo viagem, rio a baixo, antes da eminente e colapsiva cachoeira.
DEMONSTRAÇÃO GRÁFICA DAS TRANSFERÊNCIAS DA UNIÃO x IPIAÚ-BA
REPASSES DO FPM DOS ÚLTIMOS 10 ANOS
DEMONSTRAÇÃO GRÁFICA DAS TRANSFERÊNCIAS DA UNIÃO x IPIAÚ-BA
REPASSES FEDERAIS DO FPM (DESTAQUE MARÇO DE 2022)
DEMONSTRAÇÃO GRÁFICA DAS TRANSFERÊNCIAS DA UNIÃO x IPIAÚ-BA
POR DOTAÇÃO TIPO-ORIGEM (DESTAQUE ROYALTIES EM 2022)
Desde que a vereança deixou de ser voluntária (1974) e passou a ser remunerada, [modelo quase Celetista], a Plebe Rude tem ocupado tais cabides de emprego e renda. Foi-se o tempo de ilustres voluntários, do quilate de Dr. Borges de Barros, Salvador da Mata, José Motta Fernandes, Edevaldo Santiago… Honesto seria o vereador que diz: “Não sou rico, estou rico”. Ao invés do cínico termo combinado, em coro, que diz: “Não sou vereador! Estou vereador”.
A tal cúpula econômica-civil, tem preferido se esquivar, produzir o seu, e embutir toda a carga tributária, previdenciária, desperdícios, baixa produtividade e encargos diretos e indiretos; nos preços, as ser arcada pelos “saqueadores-vítimas” de carretas da BR 101.
Os caciques dos partidos, em falso exercício da DEMOcracia, via mídias aliadas-dependentes econômicas, exaltam e conclamam iludidos candidatos a vereança, para servir apenas de captadores de votos a se somar na rubrica computável da cota do partido, e, reeleger 95% dos caciques de sempre. Fórmula infalível há décadas, desde o congresso Nacional a baixo.
Segundo o socialdemocrata alemão, Ferdinand Lassalle, considerado um precursor combativo e ativo propagandista dos ideais democráticos, numa associação liberal-progressista de Berlim, na conferência que serviu de base para um importante livro para o estudo do direito constitucional (editado e traduzido em português com o título – A Essência da Constituição); este pensador, observador do jogo político, costumava dizer que em verdade, em verdade, há pelo menos duas constituições simultâneas: A escrita, formal; e a constituição de fato, fruto do resultado consequente do embate das forças socioeconômicas, no jogo prático do dia a dia.
DEMONSTRAÇÃO BASE DE DADOS, DATAS E ABERTURA DE CRÉDITOS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE IPIAÚ-BA EM 2022
A Lei Orgânica do Município de Ipiaú-BA deixa claro em seu art. 5º. “O poder emanado do povo será exercido por meio dos seus representantes eleitos, ou diretamente nos termos da Constituição Federal”. Já no art. 6º-A, “São princípios que fundamentam a organização do Município:
- – o exercício da soberania e a participação popular na administração municipal e no controle de seus atos;
- – a garantia de acesso de todos os munícipes, de forma justa e igualitária, aos bens e serviços públicos que assegurem as condições essenciais de existência digna;
- – a probidade administrativa, está bem descrita no art. 19. “A administração pública direta e indireta do Município obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, motivação e interesse público, transparência e participação popular e aos demais princípios e disposições estabelecidas na Constituição Federal e Estadual” (…)
As perguntas que ficam são:
- Tendo a administração municipal, recentemente publicado Boletim Financeiro, oficial, com as demonstrações da execução das receitas totais, até outubro de 2022, da ordem de R$ 170 milhões, com previsão portanto, de se ultrapassar a cifra dos R$ 208 milhões até o final de 2022… Qual é a velada intensão de se subestimar receitas e apresentar o PLOA-23 com apenas R$ 150 milhões, já prevendo em seu texto original, autorização prévia de aumento dos gastos, via abertura de créditos orçamentários suplementares, [unilateral], de mais outros R$ 150 milhões? (esdrúxula aberta de créditos orçamentários de 100%, sem participação da Câmara e consequentemente da população)?
- Por que se manteve os gastos orçamentários com Saúde 2023, iguais aos valores do orçamento de 2022, cientes dos efeitos perversos da inflação vigente, além da já ocorrida, em 2022? A intensão do governo é reduzir a quantidade e/ou qualidade do atendimento aos enfermos? Para onde foi realocado tais valores sequestrados da Saúde?
- Qual a justificativa de se aumentar substancialmente (+60%) localizadamente, de forma concentrada, os recursos da “educação” [surpreendente e incomum 46% das receitas totais, quando e onde é comum apenas 25%], (leia-se derrame de dinheiro na folha de pagamento dos professores efetivos, exceto os temporários) quando ano a ano, a quantidade de matrículas, na rede municipal, vem caindo sistematicamente dado a decrescente taxa de natalidade da população? Muuuito estranho, se considerado que a prefeitura já manifestou intensão de exonerar cerca de 160 professores efetivos aposentados, os quais em junho de 2022 alguns já tiveram vencimentos totais de cerca de R$ 11 e até 20 mil no mês, (conforme consta na base de dados do FNDE), enquanto que os professores temporários tem auferido míseros R$ 2.3 mil por mês? Será que a ideia é ter vencimentos superhiper concentrados, exclusivamente para os professores efetivos remanescentes, com salários consequentes, maiores que o salário do presidente da República? Tratar-se-ia de um governo do desenvolvimento-fantasia, do tipo Saci Perere (De uma perna só)? Como parar o conjunto da sociedade de pé? [Sem produção, emprego e renda locais, o máximo que este Saci poderá produzir e entregar, a própria sorte seus jovens filhos, às periferias das grandes cidades usufrutárias da suposta “formação”].
- Qual a justificativa de licitar locação de estrutura de palco por mais de R$ 6 milhões por ano e alocar apenas R$ 1,7 milhões na Secretaria de Agricultura e “Meio Ambiente”, numa região que ainda agoniza com a derrocada da fantasma cacauicultora, péssimas condições empregatícias, de financiamento e conservação das condições operacionais das estradas vicinais rurais?
- O que está por detrás do discurso do governo municipal, em distorcer as reais informações orçamentárias e propagar que o excesso de recursos chegados ao município vem do governo do estado, quando a maioria esmagadora do volume e origem, destas super receitas, tem vindo de transferências federais, dado a galopante inflação, autos preços dos combustíveis, energia elétrica e alto nível geral de preços, associado a preponderância do governo federal, ser historicamente quem mais arrecada, (65%) da carga tributária do país, o qual é obrigado a proceder com transferências constitucionais para os municípios?
- Ciente de tal esperneio popular, legalista, constitucional, fruto de reação Democrática, qual seria a posição e ação do MPE-BA, MPE de Contas e do TCM-BA?
- Ciente de tal ocorrência em tela, exaustivamente provada, qual será a reação dos agentes sociais da Primeiridade: Salvar o caminhoneiro agonizante, destombar a carreta, ou continuar em bando, a saquear a carreta tombada?
- Por fim, fica a pergunta: Onde vão enfiar os recursos destinados via Créditos Orçamentários Adicionais “Suplementares”, abertos unilateralmente, por decreto do executivo, e qual a sua correlação com a nossa necessária retomada do desenvolvimento sustentável, em substituição ao fracassado modelo rural-monocultor, fantasma, da falida e zumbi alma penada da cacauicultura? Onde estão os ricos e “mudos” coveiros-inertes da Ceplac?
Como diria Jesus: Quem tem ouvidos para ouvir, ouça. (Lucas 8,4-15)
Para os mais astutos, sugerimos assistirem aos vídeos abaixo, (disponíveis no YouTube) como reflexão complementar a leitura.
Elson Andrade é arquiteto, urbanista, empresário e pós-graduado pelo Instituto de Economia da Unicamp