Após o fiasco, interlocutores avaliam que seria preferível que ele tivesse adiantado a ida ao Rio Grande do Sul —assolado por fortes chuvas e que precisa de ajuda federal— em vez de participar do ato
O entorno de Lula (PT) aponta uma série de erros na organização do ato em comemoração do Dia do Trabalhador, na quarta-feira (1º), e na própria participação do presidente. Da falha pela escolha do lugar, distante do centro, à tímida convocação de parlamentares e apoiadores, aliados do presidente veem desarticulação prejudicial ao governo no evento.
Se tivesse sido bem informado sobre a baixa expectativa de público, Lula não precisaria ter confirmado a presença.
Após o fiasco, interlocutores avaliam que seria preferível que ele tivesse adiantado a ida ao Rio Grande do Sul —assolado por fortes chuvas e que precisa de ajuda federal— em vez de participar do ato.
O time do presidente tem reverberado o discurso crítico de Lula e culpado o ministro da Secretaria-Geral, Márcio Macêdo (PT), pelo fracasso do ato. Ele é o responsável no governo pela relação com os movimentos sociais e, segundo aliados, estimulou o mandatário a participar do evento.
Lula só confirmou a ida ao Rio Grande do Sul na noite de quarta, após o governador do estado, Eduardo Leite (PSDB), fazer publicações em redes sociais clamando por ajuda federal.
O mandatário publicou vídeo conversando com o governador ainda à noite. Só chegou à cidade de Santa Maria, uma das afetadas pelos temporais, na manhã desta quinta-feira (2), quando a situação de calamidade já completava três dias.
Enquanto ignorava a situação no Sul, Lula se expôs em um evento esvaziado —o que causou desgastes para o mandatário. Primeiro, por ter causado comparações com mobilizações recentes do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que movimentaram público muito maior. A falta de artistas conhecidos e até o tamanho do local foram avaliados como erros nesse sentido.
Segundo, por ter envolvido recursos públicos da Petrobras e da Lei Rouanet, o que aumenta as críticas ao evento.
Além disso, Lula fez pedido explícito de voto para o deputado Guilherme Boulos (PSOL) no pleito municipal de outubro, o que gerou acusações de adversários locais e indisposição com partidos da base no Legislativo federal.
O discurso de Lula em favor de Boulos foi avaliado de maneira negativa por aliados. O presidente pediu voto para o deputado paulista e, menos de um dia depois, a Justiça Eleitoral determinou que o chefe do Executivo e o YouTube apaguem a transmissão do ato.
Nesta quinta, Boulos defendeu a declaração de Lula e afirmou que é o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), quem faz uso eleitoral da máquina. Ele argumentou que Lula fez as afirmações em um evento das centrais sindicais, “não era um evento oficial do governo federal”, e minimizou as acusações de infração à legislação eleitoral por propaganda fora do prazo legal —já que houve pedido de voto, o que é vedado na chamada pré-campanha.
O deputado disse ver exagero nas ações judiciais movidas por Nunes e também por outros adversários após o episódio. Ele encampou o discurso de que o emedebista aproveitou o ocorrido para tirar o foco de problemas da administração.
No evento de quarta, Lula deixou clara a insatisfação com o chefe da Secretaria-Geral. “Vocês sabem que ontem eu conversei com ele [Márcio Macêdo] sobre esse ato e disse para ele: ‘Ô Márcio, o ato está mal convocado’. O ato está mal convocado, nós não fizemos o esforço necessário para levar a quantidade de gente que era preciso levar”, disse o presidente.
Há uma avaliação de integrantes da Esplanada e da base no Congresso, porém, que os erros não foram apenas de Macêdo.
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT), também entrou na mira das críticas internas. Ele faz o contato diário do Executivo com os sindicatos, que fizeram uma baixa mobilização de seus afiliados.
O ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), também foi contestado. Os deputados paulistas da base foram convidados de maneira burocrática, via mensagem da assessoria. Tampouco houve mobilização sobre a militância petista para garantir um público maior.
As críticas atingiram o gabinete presidencial como um todo, chefiado por Marco Aurélio Ribeiro, conhecido como Marcola. É deste setor a responsabilidade por montar a agenda de Lula e preparar o cerimonial dos eventos que ele participa.
O questionamento é se o gabinete, que tem uma equipe grande, não identificou potencial fracasso do ato e, mesmo assim, manteve-o na agenda.
Outra fonte de desgaste para o governo foi com relação ao financiamento. O anúncio do ato mostrava a Petrobras como patrocinadora.
A empresa estatal deu R$ 3 milhões para a atividade via Programa Petrobras Cultural e afirma que o patrocínio seguiu todas as exigências para ser concedido.
Também houve recurso captado via Lei Rouanet. A produtora do evento foi autorizada a levantar até R$ 6,3 milhões, mas conseguiu arrecadar R$ 250 mil de uma faculdade privada de medicina, a São Leopoldo Mandic.
O presidente do MDB, Baleia Rossi, que faz parte da base do governo no Congresso, também criticou o presidente. No evento, Lula também tratou o atual prefeito, Ricardo Nunes, como “nosso adversário municipal”, embora ele seja apoiado por diversos partidos que fazem parte da base do governo federal.
“Foram declarações absolutamente infelizes. Dia do Trabalho é dia de luta, de busca de conquistas, e infelizmente a gente não tem tanto a comemorar”, disse Baleia.
Catia Seabra e Matheus Teixeira/Folhapress